eu não parava de gritar.

Maria Carolina de Souza
2 min readJan 9, 2021

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ele estava ali, diante de mim. e, de repente, todas as minhas dores vieram à tona. o cansaço da faculdade. a sensação de insuficiência. a inconstância na vida com Deus. a perda de prazer. o afundamento no entretenimento com o propósito de esquecer. as rachaduras em cada um dos relacionamentos que construí ao longo desses anos. tudo isso se revelou diante de mim à medida em que olhei nos olhos dele,

e já não eram os olhos dele. já não eram os olhos pelos quais outrora eu fora apaixonada. já não eram os olhos que me inspiravam alegria. paz. confiança. certeza. eu costumava olhar pra ele e então sabia que tinha feito a decisão certa, não importava as tantas e tantas dificuldades que se apresentavam diante de mim pra me impedir de chegar a ele. e, por mais que na distância eu constantemente me perguntasse se não havia algo de muito errado nisso, quando eu olhava nos olhos dele eu sabia que tinha feito a decisão certa. ele era a decisão certa. era a decisão do meu coração.

todavia, meu coração enganoso estava certo em estar errado. a distância era a luz de que eu precisava pra compreender que nenhum daqueles meus sonhos em relação a ele deveriam se concretizar, mas essa luz se esvaía nas trevas da minha paixão. eu não queria enxergar diante dele. não queria enxergar que ele era completamente falho. não queria enxergar que ele me machucaria. não queria enxergar que as suas falhas eram inaceitáveis diante dos planos que eu construía sozinha. não queria enxergar que ele não gostava de mim e que a qualquer momento ele iria embora

como ele foi. ele era tudo pra mim e ele foi embora. deixou-me sozinha no lugar aonde havia me conduzido. e na minha solidão eu já não era capaz de enxergar mais nada. nem sua beleza que por tanto tempo havia me encantado nem suas falhas que tão intensamente haviam me machucado. eu me recusava a enxergá-lo, por medo do monstro que se tornaria pra mim ou da figura venerável que poderia nunca ter deixado de ser. procurei admirar todo o mundo à minha volta, ocupar todas as coisas na minha cabeça, mas ele ainda estava presente em cada segundo da minha rotina.

por isso eu precisei enxergá-lo. ele estava ali, diante de mim. e, de repente, todas as minhas frustrações vieram à tona. eu não parava de gritar, com raiva. estressava-me. agredia-me. e então ele disse que eu só estava assim porque estava frustrada com o fato dele ter me deixado. todas as minhas frustrações no fim das contas se voltavam ao fato dele ter me deixado. eu não fui capaz de mantê-lo e já não me vejo capaz de nada. ele me magoou. se me perguntassem por que, eu teria centenas de motivos, mas nenhum parece suficiente. é como se eu os usasse para tentar validar a minha mágoa, mas a razão principal é muito simples: ele foi embora. ele não me ama. e ele nunca vai voltar.

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Written by Maria Carolina de Souza

eu nem tenho mais o cabelo loiro, mas essa foto me deixa chique. escrevo sobre a vida, tanto quando ela é boa quanto quando ela é dolorida.

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